Os dez homens importantes sentados ao redor da bola discutiam acaloradamente:
– A bola é grená, disse um.
– Claro que não, a bola é bordô, retrucou outro em tom raivoso.
Todos
estavam fascinados pela beleza da bola e tentavam discernir a cor da
bola. Cada um apresentava seu argumento tentando convencer os demais,
acreditando que sabia qual era a cor da bola. A bola, no centro da sala,
calada sob um raio de sol que entrava pela janela, enchia a sala de uma
luminosidade agradável que deixava o ambiente ainda mais aconchegante,
exceto para aqueles dez homens importantes, que se ocupavam em defender
seus pontos de vista.
–
Você é cego?, ecoou pela sala gerando um silêncio que parecia ter sido
combinado entre os outros nove homens importantes. Era até engraçado de
observar a discussão – na verdade era trágico, mas parecia cômico. Todos
os dez homens importantes usavam óculos escuros, cada um com uma lente
diferente. Talvez por causa dos óculos pesados que usavam, um deles
gritou “você é cego?”, pois pareciam mesmo cegos.
Depois
do susto, a discussão recomeçou. O sujeito que acreditava que a bola
era cor de vinho debatia com o que enxergava a bola alaranjada, mas um
não ouvia o que o outro dizia, pois cada um usava o tempo em que o outro
estava falando para pensar em novos argumentos para justificar sua
verdade. Aos poucos, a discussão deixou de ser a respeito da cor da
bola, e passou a ser uma troca de opiniões e afirmações contundentes a
respeito das supostas cores da bola. A partir de um determinado momento
que ninguém saberia dizer ao certo quando, os dez homens tiraram os
olhos da bola e passaram a refutar uns ao outros. Em vez de sugestões do
tipo: – A bola é vermelha, todos se precipitavam em listar razões
porque a bola não era grená, nem cor de vinho, nem mesmo alaranjada.
De
repente, alguém gritou: – Ei pessoal, onde está a bola? Todos pararam
de falar – estavam todos falando ao mesmo tempo, e foi então que
perceberam um alarido parecido com aquelas gargalhadas gostosas que as
crianças dão quando sentem cócegas. Correram para a janela e viram uma
criançada brincando com a bola, que parecia feliz sendo jogada de mão em
mão. Ficaram enfurecidos com tamanho desrespeito com a bola. Ficaram
também muito contrariados com a bola, que parecia tão feliz, mas não
tiveram coragem de admitir, afinal, a bola, era a bola.
Lá
fora, sem dar a mínima para os dez homens importantes, estavam as
crianças brincando e se divertindo a valer com a bola que os dez homens
importantes pensavam que era deles. E nenhuma das crianças sabia qual
era a cor da bola.